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sábado, setembro 15, 2012

Alimentando a alma


Capítulo 9 do livro O espelho de Alice B.

Matar um homem foi um episódio muito ruim da vida de nossa sobrevivente. Seu tio já não sentia se mal após fazer isso, mas ela, uma garota somente, teve de aprender a conviver com o fantasma do morte, que por longos anos a perseguiu.

Hoje, anos depois, sei que não tive escolha, ou eu o matava ou morria, embora ás vezes me pego com o pensamento de que mesmo que eu não matasse aquele homem, eu não seria morta. E isso me faz sentir culpada pelo que fiz.
Já fazem alguns anos que os pesadelos pararam, mas, logo que aconteceu, eu sonhava com o rosto dele coberto por um capuz, ali, deitado, sem saber, já esperando a morte.
Eu não sabia atirar, apenas o básico visto na televisão. Foram 3 tiros mas após o terceiro eu apaguei, e não sei se continuaram atirando por mim, imagino que não.
Quando acordei ele já não estava mais perto de mim, eu estava novamente no meu quarto escondido atrás daquele velho espelho. Deitada na cama, onde permaneci deitada por dias, sem conseguir comer, nem me banhar.
Meu corpo foi definhando, minha mente parecia estar em outro lugar, longe dali, somente eu e aquele homem. Eu não sei meu peso antes disso, mas, minhas roupas não cabiam mais, e tiveram que me dar outras roupas, de quando eu ainda tinha meus 6/7 anos. Eu passei a pesar menos que 30 kilos e continuei nesse estado de magreza até meus 18 anos.
Depois, fui saber que naquela época eu tinha adquirindo anorexia nervosa, uma doença que por mais magra que a pessoa esteja, ela continua se vendo da forma como estava ou maior ainda.
Eu comia pouco, meu peso continuava bem baixo. Mas, naquela época eu não tinha uma relação com o espelho, nunca me olhava em um, apenas, nas raras vezes em que saía do quarto. E mesmo assim, eu evitava me olhar, por causa das cicatrizes e machucados. Eu me sentia uma miniatura de monstro, deformada, ossuda, praticamente careca de tanto que me cortavam os cabelos por causa dos piolhos. Eu tomava banho a cada 2, 3 dias, pois, quando eu não esquecia, ele não lembrava que eu precisava tomar banho . Ou eu estava de castigo e tinha de ficar suja por dias. Magra e suja.
Em relação á vomitar a comida, eu fazia isso sem pensar, mas, quando sentia muita dor ou estava muito deprimida. No começo eu forçava o vômito quando queria ficar em paz, pois ficava fraca e desmaiava, mas, depois, comecei a usar como fuga emocional, se estava ruim emocionalmente eu ia e forçava o vômito.
Eu não somente vomitava os alimentos, mas, era como se vomitasse também a minha alma.

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